Ano: I Número: 9
ISSN: 1983-005X
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A evolução das coisas úteis, de H. Petroski

Gilberto Paim

Que um projeto bem elaborado, objetivo e racional, que visa em primeiro lugar a funcionalidade do objeto possa alcançá-la imediata e plenamente, eis aí uma premissa do design moderno que o engenheiro e historiador Henry Petroski pretende corrigir em seu A evolução das coisas úteis (Jorge Zahar Editor, Rio de Janeiro, 2007). Segundo ele, a forma raramente segue a função: o mais comum é que ambas estejam em conflito.

A funcionalidade do objeto resulta de um processo complexo de redesenho e remodelagem, que envolve tempo e a participação de múltiplos atores. Enquanto as falhas do objeto não são identificadas pelos usuários, a sua evolução funcional não tem chance de começar. Soluções surpreendentes e muito proveitosas acontecem, porém, quando há um ou mais inventores talentosos dentre os usuários insatisfeitos com o desempenho de um determinado objeto.

Ele analisa com riqueza de detalhes a lenta adequação, no entanto sempre imperfeita, entre a forma e a função em objetos cotidianos como talheres, clipes, zíperes, garrafas pet, latas de alumínio, abridores, fitas colantes e lembretes post-it. Esses objetos evoluíram como resultado de uma sucessão pragmática de ajustes realizados por diferentes personagens, anônimos ou não. Petroski privilegia a continuidade do aperfeiçoamento, cuja dimensão é coletiva, à vontade de ruptura do projeto autoral. E alerta para a fragilidade do equilíbrio entre forma e função, vulnerável à influência da moda e do design.  

Os designers desempenham papel secundário no livro, no qual engenheiros e técnicos são os grandes protagonistas, os inventores. Idéias e realizações de um único designer são comentadas. Elas são do franco-americano Raymond Loewy, pioneiro do estilo aerodinâmico em eletrodomésticos, o
streamlining, que obteve imenso sucesso comercial nas décadas de 1930 e 40. A exemplo de Loewy, a atuação dos designers se limita, segundo Petroski, a corrigir esteticamente os objetos industriais e a desenvolver novos produtos que diferem apenas na aparência, em sintonia com os departamentos de marketing. Não é raro que a sua ênfase nas considerações estéticas comprometa gravemente a funcionalidade dos objetos:

“Muitos dos jogos de talheres contemporâneos parecem ser desenhados com base mais na aparência que no funcionamento, o que contradiz todas as expectativas racionais da evolução tecnológica. Mas o paradoxo é solucionado se compreendermos que existe um tipo de design que pode ignorar por completo a funcionalidade. Talvez essa seja a escola de design da ‘forma sem função’, que coloca a estética, a novidade e o estilo acima de tudo”. (p.168).

Desqualificação do design em relação à engenharia? Do estético em relação ao utilitário? Redução do vasto campo do design à cosmética industrial? A narrativa minuciosa de Petroski, sobre o aprimoramento prático de tantos objetos de uso corrente, aparentemente neutra e objetiva, traz algumas questões polêmicas.
   

 


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