A Bela Adormecida
Natália Leon Nunes
1848 não foi apenas a data de publicação do manifesto comunista, escrito pelos filósofos alemães Marx e Engels. Também as artes plásticas são marcadas por esse data. No caso, o palco é a Inglaterra e a Royal Academy of Arts. Nessa época foi fundada a irmandade pré-rafaelita, grupo de pintores que se opunham às normas pictóricas da Academia e buscavam inspiração na pintura anterior ao renascentista Rafael. É um pouco de sua obra que pode ser vista no Museu do Prado, em Madri, Espanha, na exposição A Bela Adormecida, que vai até o dia 31 de maio.
A exposição apresenta dez pinturas e sete estudos sobre papel. Ao todo, são cinco pintores: Edward Coley Burne-Jones, William Holman Hunt, Frederic Lord Leigton, Dante Gabriel Rossetti e John Everett Millais. As obras vêm do Museu Del Arte de Ponce, de Porto Rico. A exposição ocupa apenas uma sala e seu nome, A Bela Adormecida, refere-se a três quadros de Burne-Jones, nos quais o pintor retrata três diferentes cenas do conto - que tem o mesmo nome das pinturas - publicado pelo escritor francês Charles Perrault, pai das histórias infantis e dos contos de fada.
Com o estilo denominado vitoriano, a irmandade fazia meticuloso estudo da natureza. A primeira fase da pintura pré-rafaelita é marcada por obras de forte conteúdo moral. Já na considerada segunda fase, os pintores se distanciam da moralidade expressa nas pinturas e buscam temas ligados à beleza feminina e à femme fatale, além de misturarem elementos clássicos e medievais. Ainda que não seja homogêneo, o conjunto de obras desta exposição traz em comum o sono e o sonho, como refúgio para uma natureza dotada de certa magia.
É de pensar o surgimento de um movimento que, embora defendesse a arte pela arte, opondo-se à rigidez da Academia, tinha como fonte a arte do pré-Renascimento. E retratava, além de cenas religiosas, contos de fadas e mulheres dotadas de perfeição e beleza. Tudo isso na Inglaterra do século XIX: a maior potência econômica do período;em meio à expansão da revolução industrial pelo mundo, à consolidação do capitalismo e às conseqüências das políticas do século XIX inglês, tais como a lei do cercamento, que expulsara boa parte da população do campo.
No mundo urbano da produção e da rapidez, em meio às grandes guerras, surge uma arte que, no lugar de expressar a vida sem mistificações e a miséria ou - por que não - o progresso, traz à tona o mundo dos contos de fada. É nele que dormem as belas musas dos pré-rafaelitas.
Há o sono, como refúgio do caos da cidade e da indústria que se instaura e, é possível arriscar, como breve ensaio para a morte. E há o sonho, talvez único espaço onde ainda seja possível encontrar um mundo mágico. A arte mostrada como fuga para um mundo onírico, nestes breves exemplos da arte inglesa do XIX, talvez seja mais interessante do que os livros esotéricos e de auto-ajuda, recorrentes na busca de uma válvula de escape para a sociedade em que vivemos hoje.
Natália Leon Nunes é estudante de filosofia.
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