|
Olivetti, a saga de uma companhia
Heloísa Dallari
A Olivetti é sempre mencionada na história do design como empresa modelo de inovação e ousadia. Coube ao historiador e crítico de design italiano, Enrico Morteo pesquisar junto com Manolo De Giorgi, os meandros dessa história. O material resultante deu origem a uma exposição homônima, um dos principais eventos da Torino 2008 World Design Capital. Em sua explanação, Morteo recupera a história da indústria Olivetti fundada em 1908, na cidade de Ivrea, província de Turim. O farto material iconográfico era proveniente dos arquivos históricos pertencentes à Fondazione Adriano Olivetti e ao Laboratório-Museo Tecnologic@mente.
A saga dessa companhia passa pela direção de três gerações distintas, havendo sempre muito cuidado com a qualidade das máquinas de escrever e na maneira de anunciar seus produtos, de modo que os valores caros à Olivetti, como facilidade, limpeza e rapidez, ficassem claros para o grande público. Durante os 95 anos de existência da empresa, sucederam-se em sua direção o patriarca Camillo (1908-1924), seu filho Adriano (1924-1960) e o neto Roberto (1960-2003). Ao mesmo tempo em que se dedicava a um mercado consumidor diferenciado, a companhia fabricava objetos de alta qualidade tecnológica e elevada intenção estética, a empresa foi considerada modelo, por estar irremediavelmente comprometida com o bem-estar social de seus funcionários. Deste modo, a Olivetti soube conjugar inovação e experimentação, sendo considerada como um caso único no panorama empresarial italiano.
Para Enrico Morteo, dois eventos podem mostrar-se emblemáticos para o entendimento do caráter singular desta companhia. Em primeiro lugar, o fato de Camillo, no início da Olivetti, liberar seus empregados do trabalho na fábrica para que pudessem participar das atividades de colheita nos campos, ajudando suas famílias. Além disso, Camillo abre uma caixa de assistência mútua, com recursos provenientes tanto da própria companhia (75%), quanto dos operários (25%). Outro episódio significativo ocorreu quando Adriano, ao formar-se como engenheiro químico, teve que trabalhar na linha de montagem das máquinas de escrever pelo período de um ano. Deste modo pode adquirir experiência na no processo de fabricação e procurou entender o que representava socialmente ser um operário.
Ao final deste período, Adriano ficou nos Estados Unidos por um ano, investigando a nova cultura industrial americana. Quando retorna à Itália, o jovem industrial considera Camillo paternalista e passa a ser o responsável pela organização comercial e comunicativa, assim como pelas filiais estrangeiras da Olivetti, abertas ainda em 1919 na Espanha, na Argentina e na África do Sul. Adriano se dedica à organização do trabalho e à produção industrial eficiente, sendo que a própria empresa é produtora dos componentes e equipamentos para a fabricação de suas máquinas de escrever, sem que seja necessário adquirir nada de terceiros. Há uma integração inédita entre campos recentes e tão diversificados como engenharia de produção, recursos humanos e design de produto, elevando-se a um só tempo produtividade e qualidade projetual.
Adriano Olivetti implementa uma mudança bastante significativa ao deixar em Ivrea apenas o setor de pesquisas e estudos tecnológicos, transferindo o departamento de comunicação e publicidade para Milão. A transferência da dimensão comunicativa da Olivetti para uma cidade de cunho internacional é de absoluta relevância para uma empresa que visa uma difusão diferenciada para suas máquinas em âmbito mundial.
Neste momento, Milão está estabelecida como centro das vanguardas criativas italianas, sendo aí que se instala o reconhecido Studio Boggeri, integrado por figuras como Max Hubert, Bruno Munari e Bob Noorda, entre outros. Este escritório foi pioneiro na elaboração de projetos de comunicação visual e trabalha para grandes companhias, dentre as quais a própria Olivetti. Instala-se assim a construção de uma imagem coerente da marca, abrangendo valores tecnológicos, sociais e de design. Essa tarefa é supervisionada de perto por Adriano Olivetti, precursor na valorização da comunicação visual como algo não dissociado da empresa.
Ao Studio Boggeri cabe apenas a interpretação das diretrizes éticas e estéticas fornecidas pela companhia, tanto na confecção de peças publicitárias como na criação de sua identidade coorporativa. Esse conceito foi de fundamental importância para a distinção e a afirmação desta marca no mercado, sendo a Olivetti, mesmo extinta, um exemplo de cultura industrial ainda hoje.
|
|
Comentários
MAURO CLARO
21/07/2009
oi Helô,
Concordo com os que escreveram antes de mim sobre a importância de veicular entre nós experiências empresariais esteticamente modernas; claro que tenho em mente a Unilabor, meu assunto de pesquisa. Como a Unilabor, como a Mondragón, na Espanha, como a Scott-Bader na Inglaterra (que tentou socorrer a Unilabor no período de sua crise, entre 1963 e 1967) e como, me parece (e fundamentalmente como), Boimondau na França, que até onde sei pode ser considerada o parâmetro das experiências empresariais de fundo humanístico do século XX; todas elas, dizia, apontam para o lugar concreto da lida diária do operário, do designer, do projetista, do gerente da oficina; todas elas têm ideologia e afirmam-na, e não é uma qualquer: sua base é a cultura modernista. É mesmo importante recuperar estas experiências ainda mais porque hoje o que se vê é uma tendência à negação de compromissos ideológicos - coisa que, de fato, me parece, não pode ser aceita acriticamente.
ab, Mauro Claro
Teo Lindenberg
18/07/2009
Helô: como sempre você é bacana de ler. Muito bom mesmo!
clelai crepaldi
17/07/2009
Helô,
Muito legal ler seus textos, como sempre, acrescentando ! Parabens e sucesso!
ciça frança
17/07/2009
Helô, bacana o livro e seu texto, trazendo mais elementos para se pensar o papel da empresa, entre nós, ao se aprofundar o intricado universo dessa companhia italiana. Admiração, ciça
Envie um comentário
RETORNAR
|
|
|
|