Ano: III Número: 25
ISSN: 1983-005X
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Calendários 2010

Ethel Leon

Nesse período de violenta aceleração do tempo/espaço, é formidável ver que algumas marcações permanecem. É o caso dos calendários. Dois deles acabam de ser lançados por escritórios de design e celebram cidade/região brasileiras.

O mais tradicional é o da Portfolio Design, de Porto Alegre. Sua titular, Marilia Ryff-Moreira Vianna, produz, faz 12 anos, um calendário que trata de registrar paisagens do Rio Grande do Sul. Nesse ano, a peça foi feita em conjunto com a gráfica Impresul, tem fotos de Leopoldo Plentz e mostra o patrimônio arquitetônico, inclusive a esplêndida (ainda) arquitetura eclética gaúcha. O calendário se chama Ao Sul do Rio Grande do Sul. 

Marilia explica: "Neste Ao Sul do Rio Grande do Sul, imagens da cidade de Jaguarão, na fronteira com o Uruguai, que tem conservado patrimônio arquitetônico, com destaque para belo portais. O interessante é que a preservação dos prédios é, na maioria dos casos, iniciativa particular dos cidadãos, sem grandes verbas públicas. Contrastando com a arquitetura, cenas rurais, em meses alternados."
 
O segundo é projeto de Laura Escorel da Editora Ouro sobre Azul,do Rio de Janeiro, em conjunto com a Gráfica Ipsis, de São Paulo. A peça celebra o Rio de Janeiro em fotos de Pepê Schettino. E, apesar de se deter nas paisagens mais conhecidas do Rio, consegue um olhar de estranhamento, na belíssima reprodução das fotos em preto e branco e nos ângulos inusitados dos famosos pontos turísticos. Curiosamente, as fotos conseguem uma densidade impressionante da luz, distanciando-se das fotos ‘turísticas’ e, ao mesmo tempo, mantém um olhar sutilmente enamorado do que poderiam ser os lugares-comuns da Cidade Maravilhosa.

A produção de calendários por estúdios de design e por gráficas remete, certamente, à tradição gutemberguiana. Entre as peças impressas pelo tipógrafo alemão está um calendário, com forma e sentido muito diverso dos atuais, mas aí começa o hábito de gráficas produzirem calendários.

Quando relógios são cada vez mais substituídos por celulares, que deixam de ser máquinas de telefonar para transformar-se em objetos multifuncionais completíssimos, cuja finalidade, em última instância, é apagar qualquer vestígio de fixidez do tempo e do espaço (não é à toa que vemos tanta gente trabalhando com celulares e notebooks em mesas de fast-foods de aeroportos, a qualquer hora do dia), os calendários parecem peça anacrônicas.

Eles soam vestígios de um tempo em que havia hora para trabalhar, descansar e divertir-se, conforme reivindicavam os sindicatos do século 19 e 20. O mês, embora não mais ligado ao mundo agrícola, das estações do ano, transformou-se em unidade de ganho, do salário. As semanas, pontuadas pelos dias de descanso e trabalho. E o ano, o ano, bem, esse ainda é a grande unidade arbitrária que, no tempo das carreiras estáveis, valia promoções, acúmulos salariais etc..

Hoje, o calendário se tornou peça destituída dessas marcações, mas ganha importância para outro tipo de registro. O dos aniversários, por exemplo. O do dia dos pais, das mães, Natal, Páscoa etc.., que, embora possam  guardar memórias de tempos em que religião e família tinham diferentes significados e maior presença no cotidiano, são encarnados, hoje, por  novas aptidões. São rituais que celebram ...rituais, sem significado denso na vida das pessoas. Aniversários são momentos de consumo, assim como casamentos, noivados, festas de debutante (se o début é cada vez mais precoce e as apresentações são feitas de outras formas...).

E lá estão os calendários para marcar tudo isso. Mas os calendários, nossos dois da Portfólio e da Ouro sobre Azul, de toda forma, condensam o tempo em espaço gráfico, falam de paisagens que nos são conhecidas, mas se apresentam em registros atualizados. E dão continuidade a uma herança do mundo gráfico, o que, entre nós, com todas as dificuldades de formar uma tradição, é mais do que providencial.

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Leia também
este outro artigo sobre calendários publicados na AgitProp em 2008.

 


Comentários

Laura Escorel
10/03/2010

Ludmila, fico feliz em saber que você gostou do trabalho. O calendário pode ser adquirido aqui na editora com andreia@ourosobreazil.com.br ou através do link http://web.me.com/pepe.foto/pepe.schettino/2010.html

Ludmila Magalhães
08/03/2010

Boa noite, gostaria de saber como posso adquirir esse calendário com fotos do RJ feitas por Pepê Schettino. Vi um desse....é perfeito.....quero muito um! Obrigada

Renata Rubim
01/02/2010

Ethel, que ótimo voce abordar o tema e mostrar esses dois ótimos exemplos! Não abro mão de bons calendários ao meu redor que não serão substituídos pela tecnologia digital.

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