Este livro é uma fotografia, ou seja, um instantâneo da mente de um pesquisador sempre inquieto. O conteúdo das próximas páginas, a este momento, provavelmente já se transformou na mente do autor. Se isso é verdade para todos nós, visto que o devir é uma condição essencial de nossa humanidade, a convivência nos faz intuir que para ele o seja ainda mais. Fundamentalmente devido ao seu próprio caráter, que faz de si mesmo uma “antena”, captando e interpretando as mudanças em ato, incessantemente reelaborando-as em contribuições à disciplina de design, de maneira a compor uma contribuição acadêmica tão relevante quanto amplamente reconhecida no setor[1].
Entre tais movimentos foi recompensador conseguir “aferrar” nosso pluripremiado autor e trazê-lo ao Brasil para que, em uma seqüência de aulas, nos contasse suas idéias. O curso[2] denominado DESIGN.ISDS 1 – Design, Inovação Social e Desenvolvimento Sustentável foi realizado de 27 a 31 de agosto de 2007, tendo sido financiado pelo programa Escola de Altos Estudos da Capes e promovido pelo Programa de Engenharia de Produção da COPPE-UFRJ em uma iniciativa coordenada pelo professor Roberto Bartholo.
O presente livro é o resultado dessas aulas. Tem o valor de oferecer um panorama seqüencial das idéias do professor, sintetizando em uma concisa publicação conceitos distribuídos em diferentes artigos ao longo dos últimos anos. Inclui também material que é fruto de suas mais recentes atividades de pesquisa. Este constituiu o caráter particularmente dinâmico do presente texto que, em relação ao original (fornecido como material didático durante as aulas há um ano), sofreu modificações de modo a precisar alguns de seus conceitos-chave. A tradução dos conceitos desta obra, a partir da versão original em língua inglesa, foi detalhadamente discutida com o autor.
O livro é a segunda obra de Manzini traduzida para o português no nosso país. No Desenvolvimento de Produtos Sustentáveis[3], o autor tratou da relação entre design e ambiente dando uma particular atenção ao desenvolvimento de produtos com baixo impacto ambiental, tendo concentrado-se nas estratégias de projeto que, considerando o ciclo de vida dos produtos, permitem obter produtos eco-eficientes.
Agora, em Design para a Inovação Social e Sustentabilidade, o autor se focaliza na contribuição que a inovação social poderia dar ao tema do design para a sustentabilidade, em termos de design estratégico e, sobretudo, de design de serviços. Segundo Manzini, “a presente obra é complementar à anterior. O fato que meus interesses estejam hoje prevalentemente orientados nesta segunda direção, não invalida a precedente. Significa somente que, enquanto a primeira é relativamente consolidada, a linha de pesquisa em design para a inovação social e sustentabilidade se apresenta ainda como um terreno muito novo e promissor (para o design e em geral). Os dois livros, colocando em evidência aspectos diversos, indicam a mesma direção: o design para a sustentabilidade requer mudanças sistêmicas”[4].
Sobre o papel do design em tais mudanças, Manzini afirma: “hoje em dia, a sustentabilidade deveria ser o meta-objetivo de todas as possíveis pesquisas em design(e não, como foi vista nos últimos anos, como um tipo de setor especializado, que corre paralelo a outros setores especializados). Provavelmente, ninguém discordaria dessa afirmação (quem poderia declarar a vontade de projetar ou pesquisar de modo a produzir insustentabilidade?)”[5]. O termo “deveria ser” indica que tal objetivo não foi atingido, sendo portanto ainda necessário considerar o design “para a sustentabilidade” como um setor específico, englobando todos os passos concretos que os designers podem conscientemente dar rumo à um futuro sustentável. Manzini indica que esses passos devem ter um caráter sistêmico e o design, para colocá-los em prática, deve possuir um forte componente estratégico. Assim sendo, em síntese, o design para a sustentabilidade é o design estratégico capaz de colocar em ato descontinuidades locais promissoras, contribuindo para efetivas mudanças sistêmicas.
O design para a inovação social é atualmente um dos propulsores da pesquisa em designpara a sustentabilidade, sendo Manzini um de seus maiores promotores. Os objetivos principais da linha de pesquisa, expressa por meio de diversos projetos desenvolvidos pelo autor e cujos resultados são sintetizados na presente obra, é tanto desenvolver a capacidade de reconhecer o valor de um caso de inovação social sustentável quanto fomentar a habilidade dos designers em projetar um conjunto de soluções capaz de aperfeiçoá-lo e de reproduzí-lo em diversos contextos. Isto incluindo o destaque dado pelo autor ao fato de que a redução do peso de nossas atividades no ambiente passa por uma regeneração do tecido social e por uma redescoberta do valor da convivencialidade, como os termos “comunidades criativas” e “organizações colaborativas” nos indicam. Este enfoque dado à convivencialidade propõe aos designers, e demais pesquisadores, desafios projetuais e conceituais inéditos.
Importante ressaltar que, no presente livro, Manzini propõe diretrizes capazes de contribuir para a definição de uma agenda de pesquisa brasileira tanto em design para a inovação social, quanto em design para a sustentabilidade. A preocupação do autor com a elaboração de uma agenda compartilhada, bem como com a articulação internacional dos pesquisadores do setor, confluiu posteriormente na elaboração (por meio de um processo participativo) de um documento entitulado Design Research Agenda for Sustainability (DRAS), durante a conferência internacional “Changing the Change”[6].
[1] É possível acessar os mais recentes textos de Ezio Manzini em seu blog: http://www.sustainable-everyday.net/manzini/ (em língua inglesa).
[2] Site do curso: http://www.producao.ufrj.br/design.isds/.
[3] MANZINI, E.; VEZZOLI, C. O Desenvolvimento de Produtos Sustentáveis : Os Requisitos Ambientais dos Produtos Industriais. Sao Paulo: EDUSP, 2002. (original: Lo sviluppo di prodotti sostenibili. Rimini: Maggioli Editore, 1998).
[4] Depoimento a Carla Cipolla em 30/08/2008.
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MANZINI, Ezio. Design para a inovação social e sustentabilidade. Comunidades criativas, organizações colaborativas e novas redes projetuais. Rio de Janeiro: E-Papers, 2008.
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Carla Cipolla é doutora em design pelo Politecnico di Milano (2007), com tese sobre Design de Serviços, teve Ezio Manzini como orientador. Durante seu doutoramento atuou em diversos projetos internacionais (tais como EMUDE, LOLA, CCSL) e eventos coordenados por Manzini, tendo sido recentemente secretária cientifica da conferência internacional de Design “Changing the Change” (Torino World Design Capital – ICSID, 2008). Assesssorou Manzini no desenvolvimento do curso DESIGN.ISDS no Brasil, o qual deu origem à este livro.
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