O silêncio dos designers
Recado de Ethel Leon
Por que designers, professores e estudantes de design têm tanta dificuldade de se manifestar publicamente sobre assuntos de sua alçada?
Faz uma semana que Bruno Porto publicou nesta seção o artigo Rio 2016, marcas à prova de bolas fora. Desde então, recebi cerca de dez telefonemas reclamando do texto com argumentações diversas. Pedi que os telefonautas escrevessem os comentários e os enviassem formalmente no espaço próprio da revista. Ninguém topou.
Muitos pediram que eu ou Marcello Montore escrevêssemos, comentássemos, nos fizéssemos, enfim, porta-vozes de várias ideias, muitas das quais, aliás, não são nossas. Recusamos.
Não concordo com muitos dos argumentos do Bruno Porto, mas a Agitprop não é espaço fechado, a não ser para comentários caluniosos, muitas vezes dirigidos a autores diversos, que, infelizmente, recebemos e sistematicamente jogamos fora.
Esta revista é um veículo sério de informação, formação e debate. Foi a isso que nos propusemos ao fundá-la e mantê-la nesses três anos de existência.
Gostaríamos que designers, professores, estudantes escrevessem o que pensam, debatendo ideias, pois é o que está em questão, em todos os artigos que publicamos, ideias, práticas, concepções, e não caráter.
Temos seções separadas para formatos de texto. A de atualidades reúne peças diversas sobre fatos, objetos do presente. Aqui não se trata de escrever academicamente, puxar longa bibiografia, mas sim manifestar-se, emitir opinião, comentar.
O silêncio escrito e os telefonemas me deram o que pensar.
Por que o campo do design é tão lacônico e parcimonioso em análises e comentários públicos? E tão afeito a manifestações de corredor? O campo conseguirá alguma legitimidade e relativa autonomia se continuar se comportando desta maneira?
Fica a pergunta. Por favor, não me telefonem para comentar, escrevam!
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Comentários
Ethel Leon
16/02/2011
Querido João,
Concordo com você! Certamente, o papel de uma revista seria, antes de mais nada, de desencavar estas histórias mal contadas e apresentá-las ao público, de modo a favorecer um debate com bases mais seguras.
Infelizmente, a Agitprop não tem recursos para promover jornalismo investigativo, que a maioria dos temas tratados exige.
Creio que o silêncio, no caso, é mais dos inocentes, pois Marilena Chauí nunca se furtou ao debate, mas tomou posição de calar-se diante da ignomínia da imprensa.
Procuramos, Marcello e eu, nos manifestar, mas também construir um espaço coletivo de reflexão e crítica. Não podemos escrever sobre tudo, como, muitas vezes, nos pedem.
O processo de concurso ou prêmio etc. é fundamental para entender o resultado. Saber quem é o júri também. Mas, na ausência desse tipo de informação, há que encarar o resultado.
Comentário levianos (pró e contra) ajudam muito pouco a criar a tal da massa crítica que tanta falta faz ao design brasileiro.
O silêncio e a fofoca são prejudiciais, me parece. Há muito tempo peço a designers, críticos, curadores, editores que escrevam comentando temas da atualidade que, como você bem diz, são evitados, por exigirem mais do que a suposta neutralidade que o passado parece permitir. Difícil alguém aceitar.
Minha pergunta sobre legitimidade e autonomia diz respeito a isso. Ao medo que percebo de tomar posição, diferentemente do mundo da arquitetura, para falar de um meio próximo, em que o debate é acirrado e direto.
Você certamente não se encaixa no perfil omisso, porque sempre sustentou suas posições publicamente e nunca temeu o debate.
Ele é necessário, sob a forma de artigo, comentário, ensaio, estudo...
Espero que a Agitprop se profissionalize para permitir que façamos um jornalismo de design que não existe no Brasil.
E, por favor, João, nem sonhe em me privar de seus deliciosos telefonemas!
João Baptista da Costa Aguiar
13/02/2011
Minha querida amiga Ethel
Fui sim um dos profissionais que telefonou para você.
Telefonei por dois motivos: primeiro: para obter maiores informações sobre o concurso e o cenário em torno do qual lamentavelmente ocorreu mais esse desastre para o desenho gráfico brasileiro.
Sou desinformado além da conta e sei disso. Nunca soube e sequer ouvi falar dos concursos que resultaram no logo Xico Xavier e muito menos no, agora, tão polêmico, das Olimpíadas 2016.
Algum veículo da grande imprensa noticiou os trâmites iniciais dos concursos? AgitProp noticiou ou comentou? Não vi nada, por certo devido à minha desatenção preguiçosa à grande mídia.
Deixei de receber algum boletim convocatório em mala direta?
Sabe dizer exatamente quem emitiu e quem recebeu?
Comentei recentemente, aqui mesmo, que não participo de concursos, assim como recuso convites para participar de juris de premiação ou seleção. É sabido que não me sinto confortável julgando o trabalho de meus colegas de ofício.
Soube da existência e vi pela primeira vez o logo Rio 2016 em meados de janeiro, pela internet, então já imerso em frondosa polêmica.
O professor Marcello Montore, também por telefone, me sugeriu que escrevesse algo aqui sobre o logo. Pelos motivos citados agradeci e não aceitei o gentil convite.
Tempos depois li, atônito, o texto do colega Bruno Porto sobre o assunto.
Ethel, no meu telefonema a você, fiz também comentários sobre o logo e sua pretensa originalidade. Disse tambem que o texto publicado por Bruno Porto, de tão ingênuo e inconsistente, seria irrespondível.
Mais uma vez fui convidado, agora por você, a escrever sobre o assunto e, mais uma vez, declinei gentilmente do convite.
Imagine o meu espanto ao ver a matéria que a revista Veja (lembram dela, aquela revista semanal?) publicou sobre o assunto. Coisa raríssima um veículo da grande mídia se interessar por desenho gráfico.
Sabemos de competente pesquisa de doutorado, em andamento, sobre o tema Veja x Design Gráfico.
O título da sua matéria: “O silêncio dos designers” faz clara alusão ao artigo da profª Marilena Chauí: “O silêncio dos intelectuais”, publicado na época conturbada do “mensalão”? Ou seria uma referência ao filme “O silêncio dos inocentes”?
Por acaso a editoria de AgitProp se manifestou claramente sobre a questão do logo das Olimpíadas? Fez considerações sobre sua originalidade, disse o que pensava?
Como revista especializada em segmento tão estrito publicou as normas de participação do concurso, as mesmas que o Prof. Montore tão oportunamente esmiuçou em artigo vibrante tambem publicado aqui sobre o mesmo assunto?
AgitProp divulgou o nome e qualificação das pessoas que compuseram o desastrado juri de premiação (AgitProp pode explicar por que eles – os jurados – são sempre tão fabulosamente anônimos?) que elegeu a marca bastarda vencedora? Houveram finalistas, quais e quantos foram? AgitProp publicou os trabalhos dos concorrentes finalistas?
Na falta de informações precisas, tentei ligar e infelizmente não consegui falar com o grande profissional, meu amigo e colega, Hugo Kovadloff, que participou do certame e foi citado na matéria de Veja, tentando obter informações mais precisas. Mais uma vez tive de usar o telefone para me informar e novamente não obtive sucesso.
Não seria uma espécie de “O silêncio dos editores” afirmar que “o campo do design é tão lacônico e parcimonioso em análises e comentários públicos? E tão afeito a manifestações de corredor? O campo conseguirá alguma legitimidade e relativa autonomia se continuar se comportando desta maneira?”
AgitProp acha que fiz mal em ligar para o Hugo? Acha também que eu não deveria ter ligado para você?
Ethel, tivemos, você e eu, em outras ocasiões, longas conversas sobre a ausência de uma crítica contempôranea participativa atuante, atenta sobre às questões do cotidiano do desenho gráfico brasileiro. Os teóricos e críticos teimam em ser mais afeitos a dissertar sobre a memória do design gráfico. É mais cômodo e, talvez, mais “culto”? Comentar fatos vivos e atuais não é também função dos críticos e editores especializados? Me parece simples demais apenas oferecer a rinha para que galos antagônicos duelem até a exaustão.
Ethel querida, escrevi isso tudo apenas para dizer que vou seguir lhe telefonando todas as vezes que sentir vontade, como tenho feito regularmente nos últimos 25 anos. Você sabe que escrever nunca foi minha função, tento ganhar a vida apenas desenhando; esse é o meu papel.
Saudades,
João Baptista
Eneida Figueiredo
11/02/2011
sim. Enquanto essas forças não forem canalizadas para elaboração de ideias e construção de um significado maior, que seja efetivamente colocado em prática, ficará sempre o hiato entre o falar, o fazer, e se comprometer.
Patrícia Weiss
11/02/2011
Acontece que reclamar é fácil e fazer é difícil. Se você escreve, se compromete e pode ser cobrado por uma atitude. As associações que o digam...
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