Ano: IV Número: 39
ISSN: 1983-005X
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A Cidade e Sua Memória: Um Cartaz para São Paulo 2011

Paulo Moretto

Apesar de o cartaz estar cada vez mais ausente de nosso cotidiano, seja como profissionais, seja como cidadãos, ele continua a ser uma grande oportunidade para o designer expressar suas ideias, seu ponto de vista sobre temas importantes, inclusive para a construção da cidadania. O cartaz é um objeto emblemático da prática profissional do designer gráfico, além de sempre constituir um desafio projetual devido às suas dimensões e particularidades no âmbito da comunicação.

Na primeira edição da mostra Um Cartaz para São Paulo, em janeiro de 2008, momento em que a cidade atravessava um processo de “limpeza visual” – com a proibição do uso de outdoors e placas em geral –, o tema sugerido foi a poluição visual urbana. Na edição de 2009, ano em que se comemorava o 455o aniversário de São Paulo, abordou-se a “(In)sustentabilidade Urbana”, levando os participantes a expressarem suas ideias a respeito das possibilidades de uma megametrópole ecologicamente viável. Para a homenagem de 2010, propôs-se como tema a diversidade cultural, na busca de representar graficamente a profusão de dialetos, vestimentas, músicas, estilos arquitetônicos, origens étnicas, tribos urbanas e outros aspectos marcantes da capital paulista.

Nesta quarta edição, o desafio foi refletir sobre a cidade e sua memória. Os brasileiros moradores de centros urbanos de grande e médio porte parecem ter se acostumado a processos de desenvolvimento desenfreados e não planejados que levam, na sua maioria, à destruição do patrimônio histórico das cidades. A memória, como patrimônio coletivo urbano, engloba não só os bens materiais, como os edifícios e os monumentos, mas também – e talvez principalmente – os bens imateriais: os hábitos e costumes das pessoas de um determinado lugar. Coube aos participantes pensar e criar cartazes que discutissem essas e outras questões, sem deixar, é claro, de homenagear a metrópole nos seus 457 anos.

Algumas das soluções apresentadas pelos designers convidados desta edição merecem destaque. Houve as que exploraram o choque entre o novo e o antigo, como o cartaz criado por Guilherme Vieira, que insere sutilmente uma “pichação” na fachada de um edifício antigo apresentado numa foto em preto e branco. A composição, sóbria e nostálgica, retrata também um típico engravatado paulistano caminhando pelo centro da cidade.

Outras trabalharam o aspecto multifacetado da memória, como o arranha-céu de Jimmy Leroy, construído com a reunião de inúmeras partes de edificações históricas e emblemáticas paulistanas.

Houve abordagens mais conceituais. Caroline Gabriel Pedro construiu o nome da cidade utilizando as nomenclaturas de ruas que fazem referência a datas, destacando a de 25 de Janeiro, aniversário de São Paulo. Já Eduardo Foresti elaborou um mapa em que marcou todos os lugares da cidade que evocavam algum fato da sua própria história, compartilhando uma experiência que, embora pessoal, contém fatos comuns à vivência de cada um de nós.

Como nas outras edições do projeto, alguns cartazes trazem uma forte carga de nostalgia e emoção. Miguel Paladino apresentou uma foto de enquadramento inusitado que retrata o reflexo no espelho d’água ao pé de uma das colunas vermelhas do Masp – o avesso do avesso, citação inevitável ao se falar de São Paulo. Numa linha mais crítica, Minoru Naruto e Maria Argentina Bibas buscaram uma imagem pré-urbana da várzea do rio Tietê, o que nos remete à ocupação desenfreada dessas terras de Piratininga.

Essa mesma crítica é sugerida por Marcelo Pallotta num cartaz de cinema que apresenta São Paulo como um filme-catástrofe-arrasa-quarteirão. Impossível não se divertir e, ao mesmo tempo, não se preocupar com as pseudocitações “mais de 11 milhões de espectadores” ou “louco, depravado e perturbador... mas completamente brilhante”.

Outros designers e artistas que enriqueceram a edição de 2011 de Um Cartaz para São Paulo foram: Alécio Rossi, André Poppovic, André Stolarski, Delfim Cesário Jr, Filipe Negrão, Gustavo Garcia, Heloisa Etelvina, Henrique Nardi, Javier Ignacio Cifre, Juan Lo Bianco (AR), Marco Tortoioli Ricci (IT), Paulo Moretto, Paulo Von Poser e Victor Tronconi, Sandra Tucci, Sônia Magalhães e Zansky. Pode-se dizer que todos os cartazes, produzidos em cópias únicas e impressos digitalmente, nos ajudam a seguir e a nos perder pelos mais diferentes caminhos de nossa memória e de nossa cidade.



Paulo Moretto é arquiteto/mestre pela FAU-USP (1991/2004) e atua como designer gráfico. Participou de mostras internacionais como o Festival International de L’Affiche et des Arts Graphiques de Chaumont (França) e a Internacional Poster Biennale – Varsóvia (Polônia). Foi  curador da exposição “A Cultura do Cartaz” (Instituto Tomie Ohtake – São Paulo, 2008) e da 9ª Bienal de Design Gráfico da ADG. Concebeu a mostra Um Cartaz para São Paulo (Centro Universitário Maria Antonia-USP/Senac-SP), cuja curadoria divide com Alécio Rossi (de 2008 a 2011).

 


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