As cores – parte integrante da percepção humana do mundo – são elemento de comunicação universal. Objetos, alimentos, roupas e outros itens são avaliados em função de suas cores. Como se vestir de “forma cromaticamente adequada” sem ser capaz de ver a cor do vestuário? Como identificar sinais de perigo – nos quais a cor é fator de atenção – sem conseguir distinguir o vermelho do verde? Os daltônicos, que englobam cerca de 10% da população masculina do mundo, deparam diariamente com esses e outros problemas.
Neste início de outubro, o designer português Miguel Neiva, criador do ColorAdd (www.coloradd.net), esteve no Brasil para apresentar esse código de formas (figs. 1 e 2) que permite aos daltônicos saberem qual é a cor de determinado objeto. Esse projeto, inclusivo e inovador, partiu da percepção que a sociedade não estava sensível ao daltonismo e foi fruto de seu trabalho de mestrado (2000 a 2008). O código teve como premissas não constranger o daltônico, ser fácil de se integrar a outros códigos (escrito, cromático etc.), ser simples o suficiente para que não fosse necessário dedicar muito tempo a aprendê-lo, se reproduzir facilmente, suportar reduções e apresentar formas distintas para que não houvesse confusão. Como objetivo pretendeu dotar o daltônico de autoestima, segurança, conforto, qualidade de vida e bem estar.
O daltonismo, transmitido hereditariamente, é permanente (não há cura) e é basicamente uma condição masculina (98% dos daltônicos são homens). Além de limitar a escolha profissional do portador, gera diversos tipos de constrangimento. Em pesquisa, Neiva constatou que 90% dos daltônicos pede ajuda para escolher vestuário, 41% sente dificuldade ao nível da integração social e quase 50% já sentiu embaraço pela cor escolhida não ser a melhor. Os daltônicos desenvolvem estratégias para tentar não demonstrar o problema. Por exemplo, as crianças que “esquecem” seus lápis de cor em casa tendo que pedir para um colega emprestar o “verde”. Profissionais que, em reunião, ao serem perguntados sobre a adequação de determinada cor, simulam um mal estar qualquer de forma a terem que sair imediatamente do recinto.
Finalizado o trabalho, Neiva buscou, em primeiro lugar, o reconhecimento do seu trabalho em congressos, em publicações e na mídia em geral, para então passar a segunda fase que é a implantação paulatina do código por meio de licenças a custos reduzidos, mas que lhe permitem garantir o controle sobre as aplicações e avançar o projeto.
A implantação do ColorAdd já hoje abrange três áreas importantes. A educação – a empresa portuguesa de lápis Viarco licenciou o código para aplicação nos seus produtos (figs. 3 e 4); a saúde – o Hospital São João, na cidade do Porto, adotou o código para uso na sinalização, na incorporação do mesmo nas pulseiras de triagem (fig. 5) e o Centro Hospitalar de Lisboa o utiliza no sistema de diferenciação dos remédios (código padrão de cor) e os transportes – no qual as cores são fatores de identificação– linhas de ônibus e metrô (fig. 6).
Muitas outras áreas se beneficiarão do ColorAdd, como por exemplo, vestuário (etiquetas de roupas), tintas, sinalização urbana (semáforos e estacionamentos), eventos (Copa do Mundo e Olimpíadas), alimentação (distinção de uma maçã verde de outra vermelha, orientação nas lojas), jogos para crianças, área financeira (gráficos que exploram a cor).
Não é exagerado dizer que esse projeto é um “legado de Portugal à humanidade”. É o próprio Miguel Neiva quem o diz, tendo a dimensão da importância do seu trabalho, mas com humildade. Ele afirma ainda que o projeto é “ambicioso”, mas não é “ganancioso”. Neiva não pretende parar por ai, ele estuda a criação de uma ONG para sensibilizar e integrar daltônicos e não daltônicos, incentivar testes de daltonismo em escolas para que o problema possa ser adequadamente conduzido e produzir informações diversas para profissionais como oftalmologistas.
Para saber mais acesse o site www.coloradd.net/