Não há quem fale mal da regulamentação da Prefeitura de São Paulo, que proibiu outdoors nas ruas; determinou o tamanho dos painéis de fachadas de lojas e a propaganda na cidade de forma geral com a Lei Cidade Limpa (ainda o jargão higienista !). Os maldosos comentam que, desse modo, a feiúra de São Paulo ficou apenas mais exposta.
Basta locomover-se alguns quilômetros da capital do estado para perceber que qualquer feiúra construtiva é melhor do que a massa violenta de informações de gosto duvidoso aderindo às empenas de prédios e submetendo transeuntes a um assédio de todo tipo de mercadorias. Cidades como Campinas, a apenas 80 km de São Paulo, mantém o padrão pré-cidade limpa e a comparação é inevitável. Ficou melhor andar em São Paulo depois da regulamentação.
No entanto, que ninguém pense ingenuamente que a operação foi um gesto magnânimo, pautado pelo rigor do tratamento do espaço público não vendável. O projeto da Prefeitura previa a abertura de licitação de mobiliário urbano na cidade, já em 2007. Segundo notícias divulgadas na imprensa (Kassab adia licitação e libera mídia em relógios, O Estado de São Paulo, 2 de fevereiro de 2007, página C7), vai ser realizada em 2008 a licitação para implantar novos móveis da cidade.
Regulamentar a presença do espaço publicitário na cidade e circunscrevê-lo aos tamanhos e padrões semelhantes aos de boa parte do mundo é uma necessidade das empresas internacionais de mobiliário urbano. Todas elas vivem de milionários contratos publicitários internacionais. Uma viagem a diversos países da Europa mostra o mesmo rosto de modelo em propaganda de tinta para os cabelos ou telefonia celular na Itália, em Portugal e na Alemanha. O móvel é apenas um suporte da publicidade e é em função dela que se projetam as diferentes peças urbanas de serviços – de abrigos de ônibus a lixeiras, de banheiros públicos a cabines telefônicas, de bancos a postes de iluminação.
Não havia, portanto, como essas empresas internacionais se estabelecerem em São Paulo (e em qualquer outra cidade onde vigore o faroeste do outdoor e dos painéis de fachadas) sem regulamentar minimamente o espaço público e coibir os grandes formatos, incompatíveis com o mobiliário urbano padrão.
As empresas de móveis urbanos, em operações de marketing, costumam convidar grandes nomes da arquitetura e do design (Norman Foster, Philippe Starck, entre outros) a desenhar os móveis, a partir de estruturas pré-estabelecidas. Muitas vezes propõem o mínimo de elementos e não aceitam implantar serviços que seriam importantíssimos nas megalópoles, como bebedouros e bancos ou assentos de descanso. Esta, no entanto, é uma negociação a ser determinada pelo poder público.
Em Curitiba (ver imagem), onde ganhou a licitação a empresa inglesa Adshel, uma cláusula do contrato exigia que o desenho externo fosse realizado por arquiteto local. Foi assim que Manoel Coelho desenhou todo um conjunto de móveis urbanos, implantados há cerca de quatro anos na cidade. Entre eles, quiosques de flores, bicicletário, pontos de táxi e outros.
Em São Paulo, é fundamental que os futuros móveis incorporem serviços importantes, especialmente para a população de pedestres e usuária de transportes públicos. Até hoje, os abrigos de ônibus apresentam (quando apresentam) mapas mal desenhados; e raramente há informações sobre as linhas de ônibus.
Os atuais relógios (que marcam horas e temperatura) são, em realidade, enormes suportes publicitários. A empresa responsável por sua instalação é a Policrono, que teve renovado seu contrato com a Prefeitura até o final de 2008.
Seria desejável que eles fossem repensados. A Prefeitura poderia, por exemplo, exigir que uma percentagem dos relógios fosse destinado à propaganda de atividades culturais dos órgãos municipais e mesmo estaduais. Ou que fossem menores.
A cidade deve ficar “limpa” para tornar-se atrativa aos grandes negócios do mobiliário urbano. Nada impede, no entanto, que os novos móveis ofereçam serviços úteis à grande maioria. Designers, arquitetos urbanistas e população organizada podem, certamente, abrir espaço e contribuir nessas regulamentações.