Quantas vezes admiramos uma praça, um prédio ou um pequeno ambiente e nos sentimos conectados, satisfeitos, confortados? Quantas vezes olhamos para outros espaços e parece que algo nos exclui, nos deprime, nos incomoda? Diante da delicada sensibilidade que a arquitetura desperta na maioria dos seres humanos, Alain de Botton constrói o seu “Arquitetura da Felicidade” em torno da busca sobre o quê exatamente, nos lugares, espaços e construções, nos deixa em um estado de felicidade - ou o oposto disso.
Em seu caminho, De Botton coloca questões singelas como “Existe um modo de projetar que seja ‘o melhor’?” ou “Porque existe ‘a boa’ e a ‘má arquitetura’?” ou ainda “Quais os critérios que fazem com que gostemos ou não de determinado edifício, cidade ou espaço?”. Muitas vezes vistas como primárias, estas questões são esmiuçadas com muito apuro e exatidão, numa linguagem bastante atraente.
Filósofo de formação, De Botton se debruçou sobre alguns “dogmas” da arquitetura moderna e os mostra como são: nada mais que dogmas. A partir do pensamento modernista de que a beleza adviria de uma arquitetura baseada na função, na ciência e na racionalidade, os arquitetos passaram a desdenhar do design e da decoração como pontos de importância de seus espaços. De Botton mostra que esta é apenas mais uma visão da beleza, tal qual as que existiam antes do Modernismo, na época dos “estilos históricos”, como o Gótico ou o Barroco.
Contestar alguns dos pilares da arquitetura que vem sendo criada há mais de um século sem possuir um background forte na matéria é de uma coragem invejável. Mas De Botton não parece preocupado com isso. Firme ao defender que os gostos das pessoas são muito mais complexos do que qualquer conceito arquitetônico possa alcançar, e que são estas pessoas que realmente “decidem” se uma arquitetura é “boa” ou “má”, o autor demonstra que a questão estética tem a mesma força entre os arquitetos modernos como tinha no passado. Como exemplo, comenta algumas “excentricidades” cometidas por Le Corbusier na própria Villa Savoye, ícone da arquitetura modernista.
Além de explicar porque os arquitetos nunca deixaram de se preocupar em criar o belo, De Botton vasculha esta necessidade tão humana e tão comum de usufruir da beleza. E mais ainda: como decidir sobre o que é belo ou não? Como atingir o belo na arquitetura após séculos de estilos e de tentativas acertadas e equivocadas? Através de inúmeros exemplos, ele demonstra que formas nos agridem, nos animam, nos provocam angústia, nos acalentam. E, além disso, como a mudança nos ideais de uma sociedade mexe com a percepção do que é agradável e desejado pelas pessoas.
Neste ponto, o livro de De Botton é único: ressaltando as virtudes que alguns arquitetos tiveram ao erguer verdadeiras belezas da história humana, ele explica porque gostamos de uma obra e descartamos outras. Ressalta também a importância do lugar e com isso, o valor de se conceber com todo o critério o que vai ser erguido em determinado sítio.
Fundamental para estudantes de arquitetura e profissões correlatas, o livro de De Botton também provoca os profissionais da área ao levá-los a uma reflexão sobre os porquês de suas próprias obras, ou como conduzir um pensamento para chegar a um resultado que agrade funcional e esteticamente ao maior número de pessoas possível.
A obra de De Botton é uma das raras vezes em que se vê lucidez aliada a um conhecimento de arquitetura dedicados a discutir algumas questões aparentemente simples e ultrapassadas, mas que têm importância vital em nosso dia a dia de viver em espaços construídos
BOTTON, Alain de. Arquitetura da Felicidade. Rio de Janeiro: Rocco, 2007. 271pp. ISBN 978-85-325-2160-6.
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Maria Alice Miller é designer de interiores formada pela Universidade Cândido Mendes do Rio de Janeiro há 10 anos, e edita o blog Casa com Design (www.casacomdesign.com.br) há 4 anos.