Acompanhei recentemente o editor Maurício Pinto e Silva em duas jornadas de visitas a lojas da rua Gabriel Monteiro da Silva, reduto do comércio ‘design’, leia-se móveis e acessórios domésticos.
Maurício e a jornalista e também editora Ana Augusta Rocha estão preparando um guia de design de São Paulo e fomos verificar alguns dos pontos comerciais daquela região.
Era nosso interesse que os lojistas não soubessem que estávamos lá avaliando a qualidade dos produtos, do espaço expositivo, preços, informação disponível para os compradores, simpatia no atendimento etc.. Entramos, portanto, anônimos, como consumidores quaisquer. Tivemos ótimas experiências – não quero adiantar nada, pois o Guia será lançado em breve e não vou estragar aqui a surpresa.
Mas tivemos também experiências negativas e memoráveis. Uma delas foi muito engraçada e quero dividi-la com os leitores. Trata-se de uma gigantesca loja chamada Atrium.
Entramos na primeira sala da loja e ninguém nos atendeu. Lá estavam conjuntos de sofás e poltronas bem desenhados, simples e de tamanhos proporcionais aos espaços de salas de apartamentos da classe média alta paulistana de hoje. Estrutura delgada de madeira, encosto de tela plástica guarnecido com almofadas.
Caminhamos para o interior da loja, procurando alguém para pedir informações. Outra sala, essa com estantes e objetos menores. Depois de alguns minutos, uma vendedora nos abordou, perguntando se queríamos algo específico. Dissemos que não, que estávamos apenas nos atualizando. O muxoxo da moça foi quase imediato e mal disfarçado.
Em seguida, eu apontei para uma Akari e perguntei: “vocês vendem outras Akaris?”A moça me dirigiu olhar de desprezo e retrucou: “Esta é uma Noguchi”. Tive de corrigi-la, coisa que raramente faço, mas a antipatia me picou: ”Noguchi é o nome do designer, Isamu Noguchi, as luminárias se chamam Akaris”, expliquei.
A partir daí, o atendimento só piorou. Perguntei quem assinava as peças cerâmicas expostas, várias delas. A resposta veio atravessada: “São peças importadas”. “OK, respondi, mas são de quem, de onde?” “O donos trazem de viagens...”
Passamos a outras salas, ao mezanino, à parte mais nobre da loja que vende aqueles imensos sofás que hoje estão em todas as lojas de decoração e móveis da cidade. Sofás que induzem ao relaxamento, a posturas entre o deitado e o sentado, planejados para espaços imensos e que, para mim, parecem mais sofás para hipopótamos do que para pessoas.
As informações continuavam precárias, o atendimento desastroso, decidimos desistir. A moça nos acompanhou até a saída e eu perguntei o preço do primeiro sofá, aquele de tamanho de gente, de madeira, tela e almofadas forradas de algodão. “Quarenta e sete mil reais”, a moça respondeu com ar superior, imaginando meu estupor. Que foi imediato, é verdade. Ela ainda complementou com ar de desprezo: “Essa é uma peça para áreas externas, não para o living!”
“Puxa”, respondi, “Se esse sofá custa 47 mil reais, qual o preço daqueles (os de hipopótamo) lá da outra sala?” “Uma média de 70 mil reais”,esclareceu a moça, vitoriosa, imaginando, com razão, que eu jamais disporia desta soma para empregar num automóvel, quanto mais num sofá.
Quem sou eu para discutir preços de varejo de peças importadas? Amigos que moram nos EUA contam de móveis especialíssimos que compram por lá, a preços muito mais baixos do que os praticados em nossas lojas de segunda linha. Há os impostos de importação, há os custos fixos de uma grande loja situada em território nobre da cidade, mas...convenhamos, se muitos desses lojistas declaram querer criar uma ‘cultura de design’ na cidade, suas lojas não deveriam prover informação e simpatia?